No entanto, Maria Kodama-Borges - sua ex-aluna, breve esposa (esteve casada com ele no último ano de vida do escritor) e viúva há 23 anos – afirma que ele, antes de morrer, expressou que desejava ser enterrado na neutra Suíça.
Os amigos de Borges (aqueles que ainda estão vivos), em uníssono, afirmam que Georgie – como o chamavam carinhosamente – queria ser enterrado em Buenos Aires, mais especificamente, no histórico cemitério da Recoleta, no mausoléu de sua família.
Acadêmicos destacam que Borges, em vários de seus poemas deixou claro que pretendia passar o repouso eterno em La Recoleta.
Em “O Fazedor”, escreveu o verso “Quando eu esteja guardado na Recoleta / em uma casa cor de cimento”. Em “Fervor de Buenos Aires”, categoriza: “Estas coisas pensei sobre a Recoleta / o lugar de minhas cinzas”.
No entanto, prevalecia até agora a determinação da controvertida viúva, a qual os amigos de Borges chamam de “megera” (denominação utilizada pelos amigos mais moderados; outros, mais enfurecidos, aplicam epítetos não publicáveis sobre Kodama).
Kodama afirmou enfurecida: “ninguém me consultou sobre isso. É uma falta de respeito”.
Paradoxalmente, Borges poderia ser repatriado graças à seus antigos inimigos, os seguidores do general e presidente Juan Domingo Perón. O escritor costumava dizer que os peronistas “não são bons, nem ruins...são incorrigíveis!”.
Os “incorrigíveis”, em 1946, para humilhá-lo, destituíram o autor de “Ficções” e “História Universal da Infâmia” do posto de diretor de uma biblioteca e o colocaram no cargo de “inspetor de galinhas e ovos” nas feiras.
Incorrigíveis, mas pragmáticos. Os colunistas das páginas culturais destacam que os peronistas preferiram esquecer as velhas rixas de lado e apostar no prestígio político (há eleições parlamentares em outubro) e no colossal business que seria ter Borges, ícone da literatura, enterrado em Buenos Aires.
A lápide do atual túmulo de Borges no genebrino Plainpalais ostenta uma parafernália de símbolos, tal como uma nave viking, guerreiros com lanças, uma cruz de Gales, seu nome completo, além de uma legenda em anglo-saxão:“And ne forhtedon na” (“E não deverias temer”).
Segundo a amiga e ex-colaboradora de Borges, a escritora e ensaísata María ester Vázquez, “essa legenda é uma fútil recomendação para alguém como Borges. Seu desejo, expresso em seus versos ‘Só peço as duas abstratas datas e o esquecimento’ não foi levado em conta. Este túmulo en Plainpalais tem uma lápide curiosa e complicada. A única coisa que falta ali...é uma frase da Mafalda!"